Você já ouviu falar de Tribunal Racial? Só na Alemanha, nos tempos de Hitler? E no Brasil? Pois saiba que em Brasília, a poucos metros da Corte Constitucional, a UnB resolveu instalar uma Comissão Racial, de composição secreta, que, com base em critérios secretos, define quem é branco e quem é negro no Brasil.
Desnecessário comentar sobre o verdadeiro massacre ao princípio da igualdade, da razoabilidade e da dignidade da humana.
Em pleno século XXI, o item 7, e subitens, do Edital n o02/2009 do vestibular Cespe/UnB ressuscitou os ideais nazistas, hitlerianos, de que é possível decidir, objetivamente, a que raça a pessoa pertence.
Em outras palavras: será constitucional que uma comissão composta por pessoas arbitrariamente escolhidas pelo Cespe diga a que raça alguém pertence? Quais são os critérios utilizados? Em um país altamente miscigenado, como o Brasil, saber quem é ou não negro vai muito além do fenótipo. Após a Nigéria, somos o país com maior carga genética africana do mundo! Nesse sentido, importa mencionar a recente pesquisa de ancestralidade genômica realizada em líderes negros brasileiros pelo geneticista Sérgio Pena. Na ocasião, observou-se que a aparência de uma pessoa diz muito pouco em relação à ancestralidade.
O sambista Neguinho da Beija-Flor, por exemplo, possui 67,1% de ascendência europeia.
A mesma coisa pode ser afirmada em relação à ginasta Daiane dos Santos e à atriz Ildi Silva, nas quais a ascendência europeia é maior do que a africana.
Assim, no Brasil, há brancos na aparência que são africanos na ancestralidade. E há negros, na aparência, que são europeus na ascendência!
O professor Sérgio Pena, no estudo denominado Retrato Molecular do Brasil, chegou à conclusão de que, além dos 44% dos indivíduos autodeclarados pretos e pardos, existem no Brasil mais 30% de afrodescendentes, dentre aqueles que se declararam brancos, por conterem no DNA a ancestralidade africana, principalmente a materna (a medicina comprova a história de miscigenação precoce).
Nessa linha, infinitos são os questionamentos possíveis em relação aos critérios segregatórios (se é que existe algum critério) de definição racial utilizados pela tal comissão.
Por exemplo: quantos por cento de ancestralidade africana fazem alguém ser considerado negro? E se a pessoa for africana na ancestralidade, mas branca na aparência, e nunca tiver sofrido preconceito e/ou discriminação, isso faz com que ela também possa ser beneficiária da medida? E se o indivíduo negro estrangeiro tiver acabado de chegar ao Brasil para aqui ser residente, ele também pode ser beneficiário da política? E se o negro não descender de escravos, terá direito? E o branco na aparência que comprovar descender de negros escravos, poderá ter acesso privilegiado? E o negro que descender de negros que possuíram escravos, também poderá ser beneficiário?
Por outro lado, admitir que uma “Banca Racial” decida quem é negro no Brasil, utilizando-se de critérios arbitrários e ilegítimos, lastreada em perguntas do tipo “Você já namorou um negro?”; “Você já participou de passeatas em favor da causa negra?”, é totalmente ofensivo a os princípios da igualdade, moralidade, publicidade e autonomia universitária.
A questão que se levanta não é superficial: se não se pode definir objetivamente os verdadeiros beneficiários de determinada política pública, então sua eficácia será nula e meramente simbólica.
De fato, a estupidez humana parece não encontrar limites.
ROBERTA FRAGOSO MENEZES KAUFMANN
é advogada.
Fonte: Resistência e Liberdade