MINISTÉRIO    PÚBLICO MILITAR - PROCURADORIA-GERAL    DA JUSTIÇA MILITAR
 DECISÕES    DE SUBPROCURADOR-GERAL
PEÇAS    DE INFORMAÇÃO
PROTOCOLO    N. 157/2010/DDJ
Após  a declaração de suspeição por parte da Procuradora-Geral da Justiça  Militar e de seu substituto legal (fls. 9 e 11), foram-me encaminhados  os presentes autos para a devida apreciação do caso, 
no qual se  imputa a Oficial-General a suposta prática do delito previsto no art.  166 do Código Penal Militar. Narra    a notícia-crime d  fls.  2/3  que  o  General-de-Exército  MAYNARD  MARQUES DE SANTA ROSA teria sido exonerado do cargo de Chefe do  Departamento-Geral do Pessoal do Exército por ter divulgado carta, de  sua autoria, que contém crítica à Comissão Nacional da Verdade,  “adjetivando-a de ‘Comissão da Calúnia’, a qual seria composta ‘pelos  mesmos fanáticos que, no passado recente, adotaram o terrorismo, o  seqüestro de inocentes e o assalto a banco, como meio de combater ao  regime, para alcançar o poder’, dentre outras afirmações contrárias à  comissão e suas tarefas” (fl. 2).
Destarte, 
alega-se que, ao criticar publicamente resolução de  governo, qual seja, o Decreto n. 7.037, de 21 de dezembro de 2009,  editado pelo Presidente da República, o Oficial-General pode ter  incorrido no crime militar de publicação ou crítica indevida.     É o  breve relato. Decido.
O  crime militar em tela tem a seguinte redação:
Art.  166. Publicar o militar ou assemelhado, sem licença, ato  ou documento oficial, ou criticar publicamente ato de seu superior ou  assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do  Governo: Pena - detenção, de dois meses a um ano, se o fato não  constitui crime mais grave.
Constata-se    que a conduta imputada ao Gen SANTA ROSA refere-se ao segundo núcleo do  tipo: “criticar publicamente (…) qualquer resolução de Governo”. 
Examinemos, pois, o caso.  
Eis a  íntegra da carta redigida pelo Oficial-General:
A verdade é o apanágio do pensamento, o ideal da filosofia, a  base fundamental da ciência. Absoluta, transcende opiniões e consensos, e  não admite incertezas. A busca do conhecimento verdadeiro é o objetivo do método  científico.  No memorável “Discurso sobre o Método”, René Descartes, pai do  racionalismo francês, alertou sobre  as  ameaças  à  isenção  dos   julgamentos,  ao  afirmar  que  “a precipitação e a prevenção são os  maiores inimigos da verdade”. A opinião ideológica é antes de tudo dogmática, por vício de  origem. Por isso, as mentes ideológicas tendem naturalmente ao  fanatismo. Estudando o assunto, o filósofo Friedrich Nietszche concluiu  que “as opiniões são mais perigosas para a verdade do que as mentiras”. Confiar a fanáticos a busca da verdade é o mesmo que entregar o  galinheiro aos cuidados da raposa. A História da inquisição espanhola espelha o perigo do poder  concedido a fanáticos. Quando os sicários de Tomás de Torquemada  viram-se livres para investigar a vida alheia, a sanha persecutória  conseguiu flagelar trinta mil vítimas por ano no reino da Espanha.  A “Comissão da Verdade” de que trata o Decreto de 13 de janeiro  de 2010, certamente, será composta dos mesmos fanáticos que, no passado  recente, adotaram o terrorismo, o seqüestro de inocentes e o assalto a  bancos, como meio de combate ao regime, para alcançar o poder. Infensa à isenção necessária ao trato de assunto tão sensível,  será uma fonte de desarmonia a revolver e ativar a cinza das paixões que  a lei da anistia sepultou. Portanto, essa excêntrica comissão, incapaz por origem de  encontrar a verdade, será, no máximo, uma “Comissão da Calúnia”. (grifo  nosso)
Prefacialmente,    cumpre esclarecer a qual decreto o Gen SANTA ROSA faz referência. Não  se trata do Decreto n. 7.037, de 21 de dezembro de 2009, que criou a  Comissão da Verdade, mas, conforme explicitado na carta, do Decreto de  13 de janeiro de 2010, da categoria de “decretos não numerados” (Dnn), e  também, obviamente, editado pelo Presidente da República (anexo).
A  partir desse dado, fica ainda mais evidente o objeto da crítica do  Oficial-General: 
a futura composição da Comissão da Verdade, e não,  propriamente, a previsão de sua criação, constante do Decreto n.  7.037/09. Nesse    contexto, da  leitura  da  carta,  extrai-se,  em  apertada  síntese,  o  receio do seu autor a respeito da composição da referida Comissão, que,  permeada pela ideologia, será incapaz de encontrar a verdade,  revelando-se, portanto, uma “Comissão da Calúnia”.
Verifica-se,    no entanto, que ainda não há qualquer ato de nomeação dos membros da  Comissão da Verdade, pois esta sequer foi formada. O Decreto de 13 de  janeiro de 2010 tão-somente criou um Grupo de Trabalho para elaborar  anteprojeto de lei para instituí-la (art. 1º).
Assim,  estamos em que a crítica não foi dirigida à resolução de governo de  criação da Comissão da Verdade, mas aos seus futuros e prováveis  integrantes, nominados pelo Oficial-General como “fanáticos”, que não  estariam comprometidos com a exatidão dos fatos, pois, consoante se  infere da carta, agiriam de acordo com sua ideologia. Dessa    forma, a crítica do Oficial-General mais se aproximaria do delito de  injúria do que do crime de publicação ou crítica indevida. Porém, como  os membros da Comissão da Verdade longe estão de serem definidos, não há  como imputar o termo pejorativo a ninguém, restando atípica a conduta,  sob essa ótica.
Outro    aspecto a ser levado em consideração no exame da configuração do crime  de publicação ou crítica indevida é a intenção no Gen SANTA ROSA em  relação à publicidade dada, no final das contas, ao seu texto.
Na nota à imprensa divulgada pelo Ministério da Defesa em  10 de fevereiro de 2010 sobre a exoneração do General, encontra-se a  seguinte assertiva: “S
egundo o Comandante [General Enzo], ‘
trata-se de  correspondência pessoal do referido Oficial-general indevidamente  propagada pela Internet, sendo, portanto, uma opinião particular’”  (grifo nosso, anexo).
Conforme averiguado, então, 
a carta do Gen SANTA ROSA tratava-se de uma  correspondência pessoal, a qual, a nosso ver, por encontrar-se situada  em âmbito restrito e privado do remetente, está acobertada pela  liberdade de expressão, constitucionalmente assegurada.
Ocorre que tal carta teve circulação indevida pela  
Internet. Contudo, em que pese a inegável autoria da carta, 
não se pode imputar ao seu autor a  divulgação do texto e, por conseguinte, a conduta de “criticar  publicamente”.Caso contrário, restaria configurada a responsabilidade  objetiva, veementemente rechaçada pelo Direito Penal hodierno.
Uma terceira questão a ser enfrentada refere-se ao âmbito  de proteção da norma penal em comento.
Cientes de que o Código Penal Militar data de 21 de outubro  de 1969 e que, portanto, foi editado em outro contexto  político-constitucional, indagamos se o tipo previsto em seu art. 166  deve, atualmente, ser interpretado de modo a ter o maior alcance  possível, abrangendo todos os tipos de “
atos de superior”, inclusive os  da vida privada, bem como “
qualquer resolução do Governo”,  independentemente da matéria veiculada, ou se tal dispositivo legal  merece uma interpretação mais restrita, coerente com os demais tipos  previstos no Capítulo V, “
Da Insubordinação”, que levam sempre em conta  ato ou assunto atinentes à 
disciplina militar ou a 
matéria de serviço ou  dever imposto em lei, regulamento ou instrução.
Caso se entenda pelo campo de incidência mais largo,  poder-se-ia argumentar que os  militares  estão  proibidos   de  tecer  críticas  públicas  até  mesmo  às políticas econômica, fiscal e tributária brasileiras e outros 
 assuntos que a eles dizem respeito mais como cidadãos do que como  integrantes das Forças Armadas, o que não se nos afigura plausível.Assim, num contexto de duras críticas ao Plano Nacional de  Direitos Humanos, de inequívoco interesse geral, 
seria justo que somente  os militares não se pudessem manifestar enquanto vários outros  segmentos da sociedade demonstraram seu descontentamento, tais como o  clero, representantes da agricultura comercial e dos meios de  comunicação, acadêmicos, economistas, juristas etc. (anexo)? Pior, seria  razoável dar tratamento penal ao caso e imputar aos militares que  expressassem sua opinião o crime previsto no art. 166 do CPM?
Vale lembrar, ainda, que, no que concerne ao tema geral da  Comissão da Verdade, a voz do Gen SANTA ROSA não foi isolada, haja vista  a 
divulgação na imprensa da denominada “crise militar”, consistente na  ameaça de pedido de exoneração conjunta por parte do Ministro da Defesa e  dos Comandantes das Forças Armadas em razão da criação da referida  Comissão, nos termos originais do Decreto n. 7.037/09 (anexo).
Tudo isso denota que não há situação mais natural do que  a existência de críticas a questões políticas dentro do verdadeiro  Estado Democrático e Direito, em que assegurada a liberdade de  expressão.
E, especificamente quanto aos militares brasileiros, faz-se  oportuno invocar as lúcidas palavras do Marechal Osório no sentido de  que “A farda não abafa o cidadão no peito do soldado”.Por derradeiro, com isenção de juízo de valor sobre esta  medida, ressalta-se que 
o proceder do Oficial-General já recebeu pronta e  expedita repreensão, com sua exoneração do cargo de Chefe do  Departamento-Geral do Pessoal do Exército (anexo).
Diante da atipicidade da conduta do General-de-Exército  MAYNARD MARQUES DE SANTA ROSA, 
determino o arquivamento do feito.Providências pelo Departamento de Documentação Jurídica.
Oficie-se ao Promotor da Justiça Militar Dr. Soel Arpini e ao Comando do Exército, com cópia desta decisão.  Publique-se.
Brasília-DF, 10 de março de 2010.
MÁRIO SÉRGIO MARQUES SOARES
Subprocurador-Geral da Justiça Militar
Diário da Justiça -  nº 51 - pág. 51
Fonte:  Observatório Virtual 74
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