O petista que vive de brisa
Carreira Militar

O petista que vive de brisa


ANA BEATRIZ MAGNO
e JOSÉ VARELLA

Delúbio Soares de Castro é o contrário de Deus. Nunca está em lugar nenhum.
Não tem endereço nem trabalho fixos. Amigos e inimigos dizem que o filho famoso de dona Jamira e seu Antonio vive entre cidades paulistas e goianas. Por vezes passa em Brasília. Em maio, por exemplo, circulou entre as mesas do boêmio Beirute, mas partiu antes do primeiro chopp, diante dos olhos arregalados da platéia.
Seus advogados falam que o cliente tem duplo domicílio e não revelam o atual ganha-pão do ex-tesoureiro do Partido dos Trabalhadores.
O mistério é tamanho que o Ministério Público de Goiás promete ampliar, nos próximos dias, as investigações sobre os rendimentos do professor de matemática que desde os anos 1980 não pisa em sala de aula.
Goiás é seu estado. A certidão de nascimento informa que Delúbio nasceu sob o signo de escorpião, às 14h de 16 de novembro de 1955, em Buriti Alegre (GO), um minúsculo município com 8,2 mil habitantes e um lago de nome Brisas. O ex-petista vive de brisas, segundo as investigações do promotor Fernando Krebs, que estuda pedir a quebra do sigilo bancário do ex-tesoureiro ainda esta semana. “Ele é uma ficção”, alfineta Krebs.
O promotor está no encalço das histórias do amigo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva desde o começo do escândalo do mensalão e promete não descansar enquanto não provar que o padrão de vida do cidadão que adora charutos cubanos e coleciona gibis do Tio Patinhas, está muito acima do possível para um desempregado.
Nos anos 1970, Delúbio foi professor de desenho geométrico na rede pública goiana, mas desde 1986 não trabalha em colégios. Alega que está licenciado, mas a licença venceu em 2006, conforme investigação do MP. A imprensa chegou a noticiar no ano passado que a Secretária de Educação se livrara do faltoso professor. Até hoje, no entanto, a exoneração não se concretizou. Pior. Esse mesmo homem que insiste no ofício de educador se recusa a cumprir decisão judicial de maio do ano passado que determina o ressarcimento de quase R$ 165 mil ao erário pelos salários recebidos sem labuta correspondente.
“Tendo resultado prejuízo para o erário… condeno Delúbio Soares de Castro a ressarcir os cofres públicos o valor de R$ 164.695, 51”, sentenciou, em 25 de maio de 2007, o juiz Ari Ferreira de Queiroz.

Passados 13 meses, o ex-tesoureiro ainda não pagou o que deve. Seu advogado, o também petista Sebastião Leite, recorreu da decisão judicial. O recurso ainda não foi julgado. Leite, dono de uma das bancas de advocacia mais conhecidas de Goiânia, diz que está trabalhando de graça para o cliente. “Eu admiro Delúbio, sou amigo dele”, repete o advogado. “Não vou dizer do que o professor Delúbio vive hoje. É uma questão privada. Esse promotor está precisando de lexotan (calmante). É um mal amado.”

Lula na parede
Delúbio é amado pela família. A começar por seu irmão caçula, Carlos Soares, suplente de vereador que assumiu uma cadeira na Câmara e tem sete imagens do presidente Lula em seu gabinete.
Sobre as encrencas do irmão mais velho, Soares se recusa a falar. Diz que o adora e que só conversam sobre futebol. Seus companheiros de partido negam e contam que Delúbio estava por trás do mais importante movimento político do irmão vereador. Carlos Soares passou os últimos dois meses empenhado em convencer seus correligionários de que o partido não deveria lançar candidato na sucessão municipal e que deveria apoiar a reeleição do mais tradicional político goiano, Iris Rezende. Deu certo, por um voto o PT aparecerá de vice nos cartazes de Iris.

“Esse acordo significa que Iris vai apoiar Delúbio para deputado federal em 2010”, analisa uma ex-companheira de partido do clã Soares. “Delúbio não morreu. Está vivinho circulando invisível pelos bastidores.”
O ex-tesoureiro circula num Ômega cuja placa carrega as iniciais de seu proprietário. Esse carro, aliás, é o único patrimônio declarado de Delúbio e está à disposição da Justiça. “Significa que ele não pode vender o carro”, resume Krebs. “Delúbio saiu do partido, mas não saiu dos bastidores do poder. Ele é um fantasma.”
As aparições públicas do amigo de Lula são raras mesmo em Goiânia, terra em que reinava no passado. Represento o governo de Goiás em São Paulo, declarava em 17 de outubro de 2005 durante depoimento prestado no Ministério Público de São Paulo a pedido do MP de Goiás. “Depôs lá porque nunca está aqui apesar de ser funcionário público em Goiânia”, explica o promotor Krebs.
Nada bobo, o ex-tesoureiro sempre tratou de comprometer políticos de múltiplos matizes ideológicos em suas declarações. “Minha assessoria consistia em auxiliar o governo de Goiás na obtenção de verbas para a construção de estradas, verbas para estação de tratamento de esgoto, verbas para a construção da barragem João Leite, verbas para a construção do Aeroporto Santa Genoveva em Goiânia. Essa assessoria era prestada na medida da solicitação do governador (Marcone Perillo, hoje senador pelo PSDB), alfinetou o ex-tesoureiro, no mesmo depoimento firmado em outubro de 2005.

“Meu cliente não é um monstro que a imprensa pinta e não será justiçado em praça pública só porque os jornais e o Ministério Público querem. Vou ganhar tudo na Justiça”, insiste o advogado. “Delúbio está louco para voltar a trabalhar. Por que seu jornal não faz uma campanha para isso?”, brinca o advogado.

Correio Braziliense - 29 Jun 08




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